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Traumatismo Abdominal Fechado

Os traumatismos abdominais são classificadas segundo o seu mecanismo de lesão, em fechado ou aberto. No traumatismo abdominal fechado, o intestino, o baço, o fígado, os rins e os órgãos pélvicos podem ser lesados. A extensão e o tipo específico de traumatismo abdominal traumático podem ser identificados através de uma história e exame objetivo adequados, e confirmados por exames imagiológicos apropriados. A abordagem terapêutica depende da estabilidade do paciente e do tipo específico de traumatismo.

Última atualização: Nov 1, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Descrição Geral

Definição

O traumatismo abdominal fechado é definido como a presença de lesão do abdómen e/ou órgãos abdominais, secundária ao impacto de um objeto ou superfície contundente (não penetrante).

Epidemiologia e etiologia

  • Os traumatismos abdominais fechados representam 80% de todas as lesões abdominais apresentadas nos serviços de urgência nos Estados Unidos.
  • Causas:
    • Mais frequentemente causado por colisão de veículos motorizados
    • Golpes abdominais e quedas são também causas comuns.
  • Órgãos mais frequentemente lesados: baço e fígado

Anatomia

  • Cavidade peritoneal:
    • Subdividido em segmentos intratorácicos e abdominais
    • O segmento intratorácico inclui:
      • Diafragma
      • Fígado
      • Baço
      • Estômago
      • Cólon transverso
    • O segmento abdominal inclui:
      • A maior parte do intestino delgado
      • Partes do cólon
  • Retroperitoneu:
    • Difícil acesso ao exame objetivo e lavagem peritoneal
    • Contém:
      • Aorta
      • Veia cava
      • Pâncreas
      • Rim
      • Ureteres
      • Porções do duodeno e cólon
  • Compartimento pélvico:
    • Separados dos órgãos intraperitoneais por pregas peritoneais
    • Contém órgãos pélvicos
      • Bexiga
      • Útero/ovários
      • Próstata

Fisiopatologia

O trauma abdominal fechado pode ocorrer por diversos processos patológicos:

  • Desaceleração:
    • As forças de cisalhamento causam a laceração de órgãos e vasos, desde os seus pontos de fixação ao peritoneu.
    • Os rins são os órgãos mais vulneráveis.
  • Esmagamento:
    • As forças anteriores fixam os órgãos entre a parede abdominal anterior e a caixa torácica posterior.
    • Os órgãos sólidos são mais sensíveis a este mecanismo de lesão.
  • Compressão externa:
    • Por golpe direto ou compressão externa contra uma estrutura fixa rígida
    • Órgãos ocos são mais vulneráveis pelo ↑ súbito da pressão intra-abdominal

Diagnóstico

Tendo em conta a grande variedade e gravidade das lesões associadas ao trauma abdominal fechado, uma história e exame objetivo atempados, mas cuidadosos, são necessários para encaminhar a marcha diagnóstica com exames imagiológicos.

História clínica

  • Mecanismo de trauma:
    • Pode sugerir a gravidade da lesão
    • Colisão de veículos motorizados:
      • Posição do indivíduo sentado no veículo
      • Outras fatalidades no veículo
      • Grau de intrusão do carro (> 6 polegadas prevê lesões graves)
  • História prévia de trauma
  • Consumo de drogas (ilícitas e prescritas) ou álcool pelo paciente
  • Último alimento ou bebida ingeridos: importante na ponderação de intubação/anestesia
  • História cirúrgica prévia

Exame objetivo

  • Avaliação da via aérea (airway), respiração (breathing) , circulação (circulation) (ABC):
    • Via aérea:
      • Pesquisar corpos estranhos que estejam a obstruir a via aérea (a presença de dentes soltos é comum em traumatismos de força elevada).
      • Avaliar a presença de lesão traqueal (que significa uma intubação mais complexa).
      • Avaliar a presença de sons respiratórios incomuns (o estridor sugere estreitamento por corpo estranho ou edema).
    • Respiração:
      • Observar o movimento da parede torácica, pretendendo uma respiração uniforme e espontânea (movimento paradoxal do tórax sugere a presença de volet costal).
      • Auscultar os sons respiratórios (se diminuídos, ou assimétricos, podem sugerir pneumotórax ou hemotórax).
    • Circulação:
      • Palpar pulsos em todas as 4 extremidades (taquicardia sugere instabilidade hemodinâmica ou pneumotórax).
      • Avaliar o preenchimento capilar nas extremidades.
  • Avaliação secundária:
    • Examinar o paciente na totalidade.
    • Avaliar a necessidade de exames imagiológicos com base nos achados do exame objetivo.
    • A presença de uma lesão externa deve motivar a investigação da lesão interna correspondente.
    • Se o paciente se apresentar vigil e sem dores significativas, os sintomas mais específicos de traumatismo abdominal fechado são:
      • Dor abdominal
      • Desconforto abdominal
      • Achados peritoneais
    • Sinais associados a lesão intra-abdominal grave:
      • Sinal do cinto de segurança (contusões na parede do peito ou na parede abdominal; corresponde à tira diagonal ou horizontal de um cinto de segurança)
      • Hipotensão
      • Dor à descompressão
      • Distensão abdominal
      • Defesa abdominal
      • Fratura do fémur concomitante

Exames imagiológicos

  • FAST (do inglês, focused assessment with sonography for trauma): realizado em todos os pacientes (estáveis ou instáveis) para avaliar a presença de hemorragia intraperitoneal e derrame pericárdico:
    • Pacientes hemodinamicamente instáveis:
      • FAST positivo → laparotomia emergente
      • FAST negativo → pesquisar fontes de hemorragia extra-abdominais (fratura do fémur)
      • FAST equívoco → lavagem peritoneal diagnóstica (LPD), ou estabilizar paciente e realizar tomografia computadorizada (TC)
    • Pacientes hemodinamicamente estáveis:
      • FAST positivo → laparotomia emergente
      • FAST negativo, baixo risco de lesão intra-abdominal → observação
      • FAST negativo ou equívoco com alto risco de lesão intra-abdominal → TC
  • Radiografia (orientado pelos achados ao exame objetivo):
    • Radiografia de tórax pode apresentar:
      • Ar intraperitoneal livre
      • Herniação do conteúdo abdominal
    • Radiografia pélvica: As fraturas pélvicas podem ser uma fonte de hemorragia ou causar lesões vesicais.
  • TC abdominal com contraste:
    • Exame imagiológico de eleição em pacientes estáveis
    • Fornece informação relativa:
      • Estruturas retroperitoneais
      • Diafragma
      • Órgãos abdominais sólidos

Outros exames de diagnóstico

  • Hematócrito:
    • < 30% é sugestivo de lesão intra-abdominal
    • Hematócrito normal não exclui lesão grave.
  • Análise de urina: A presença de sangue é sugestiva de lesão renal/trato urinário grave.
  • Testes de função hepática
  • LPD:
    • Procedimento invasivo usado para avaliar a presença de sangue na cavidade abdominal: Um cateter é colocado na cavidade peritoneal e o líquido é aspirado e avaliado.

Características das lesões abdominais por órgão

Tabela: Características das lesões abdominais por órgão
Órgão lesado Características
Duodeno
  • Sinal do “cinto de segurança”
  • Apresentação clínica possivelmente tardia
  • Associado à fratura de Chance (lesão por hiperflexão da coluna L1 → ocorre apenas com o uso do cinto de segurança de cintura)
Baço
  • Hipotensão, taquicardia
  • Associado a fraturas costais inferiores esquerdas
  • Dor na parede torácica esquerda
Fígado
  • Hipotensão, taquicardia
  • Associado a fraturas costais direitas
  • Dor no quadrante superior direito
Pélvis
  • Hematúria macroscópica
  • Instabilidade estrutural
  • Equimoses peripélvicas
Rim
  • Hematúria
  • Dor no flanco
Trauma abdominal contuso

Sinal do cinto de segurança:
Lesões cutâneas ou hematomas distribuídos na região do cinto de segurança sugerem a ação de forças significativas após colisão de veículos motorizados, e podem implicar lesões graves subjacentes.

Imagem: “Figure 2” por Abbas et al. Licença: CC BY 2.0 .

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Tratamento

Uma investigação minuciosa permite obter informações relativas aos órgãos lesados, encaminhando a abordagem terapêutica complementar.

Tabela: Abordagem terapêutica de lesões abdominais por órgão
Órgão lesado Abordagem terapêutica
Duodeno
  • Pacientes estáveis:
    • Tratamento conservador
    • Período de observação de 9 horas
    • Exame objetivo do abdómen em série
  • Pacientes de alto risco com TC negativa:
    • Período de observação de 9 horas
    • Exame objetivo do abdómen em série
  • Pacientes de alto risco com TC positiva:
    • Admissão hospitalar
    • Podem necessitar laparotomia
Baço
  • Pacientes estáveis:
    • Tratamento conservador
    • Observar o paciente.
    • Evitar atividades extenuantes durante 6 a 8 semanas.
  • Pacientes com múltiplas lesões graves: remoção imediata do baço (esplenectomia)
  • Vacinação: Todos os pacientes com lesão extensa do baço necessitam vacinação contra microrganismos encapsulados.
    • Haemophilus influenzae
    • Streptococcus pneumoniae
    • Neisseria meningitidis
Fígado
  • Pacientes estáveis: tratamento conservador
  • Pacientes instáveis ou com evidência de agravamento da lesão hepática:
    • Embolização transcateter
    • Tamponamento (“packing”) e cirurgia
Pélvis
  • Determinar a presença de hemoperitoneu por FAST, CT, +/- LPD.
  • A fixação externa minimiza a hemorragia.
  • Angiografia com embolização para controlo de hemorragia arterial
  • Uroperitoneu (urina na cavidade peritoneal) → requer correção cirúrgica da bexiga
Rim
  • Pacientes estáveis: tratamento conservador
  • Em lesões graves:
    • A utilização de stents pode ser necessária se houver uma obstrução por coágulo.
    • A nefrectomia é o último recurso.

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Relevância Clínica

  • Traumatismo abdominal aberto: geralmente consiste na perfuração da cavidade abdominal consequente de lesão por arma de fogo (i.e. bala) ou arma branca (i.e. facada). As estruturas mais frequentemente lesadas são o intestino delgado, seguido pelo cólon, fígado e estruturas vasculares. O tratamento é por laparotomia exploradora.
  • Lesão esplénica: Em traumatismos fechados, o fígado e o baço são os órgãos mais frequentemente lesados. Geralmente, a lesão esplénica está associada a fraturas de costela inferior esquerda. As características clínicas da lesão esplénica incluem hipotensão, taquicardia, dor abdominal, dor na parede torácica esquerda e dor no ombro esquerdo (dor referida por irritação do nervo frénico consequente da hemorragia esplénica).
  • Lesão pélvica: Lesões pélvicas e fraturas pélvicas estão entre as piores complicações de traumatismos abdominais fechados. As características clínicas incluem hipotensão, dor agravada com o movimento, hematúria macroscópica e equimoses peripélvicas. O toque retal é importante para identificar lesões no reto e localizar a próstata. O tratamento é, geralmente, de suporte, embora possa ser necessária, por vezes, a estabilização cirúrgica.
  • Avaliação ABC: A avaliação ABC é uma abordagem para o tratamento de pacientes críticos. Via aérea (airway), respiração (breathing) e circulação (circulation) são os primeiros passos essenciais a serem abordados ao avaliar um paciente. Estes passos são facilmente adaptáveis em muitas situações, incluindo pacientes que não respondem, paragens cardíacas e pacientes críticos por doença médica ou trauma. Para o paciente traumatizado, o ABC está incluído na avaliação primária (ou inicial) e no tratamento das lesões.

Referências

  1. Nishijima DK, Simel DL, Wisner DH, & Holmes JF. (2012). Does this adult patient have a blunt intra-abdominal injury? JAMA. Apr 11;307(14):1517-27. doi: 10.1001/jama.2012.422. PMID: 22496266; PMCID: PMC4966670.
  2. Isenhour JL, & Marx J. (2007). Advances in abdominal trauma. Emerg Med Clin North Am. Aug;25(3):713-33, ix. doi: 10.1016/j.emc.2007.06.002. PMID: 17826214.
  3. Newgard CD, Lewis RJ, & Jolly BT. (2002). Use of out-of-hospital variables to predict severity of injury in pediatric patients involved in motor vehicle crashes. Ann Emerg Med. May;39(5):481-91. doi: 10.1067/mem.2002.123549. PMID: 11973555.
  4. Rivara FP, Koepsell TD, Grossman DC, & Mock C. (2000). Effectiveness of automatic shoulder belt systems in motor vehicle crashes. JAMA. Jun 7;283(21):2826-8. doi: 10.1001/jama.283.21.2826. PMID: 10838652.
  5. Nishijima DK, Simel DL, Wisner DH, & Holmes JF. (2012). Does this adult patient have a blunt intra-abdominal injury? JAMA. Apr 11;307(14):1517-27. doi: 10.1001/jama.2012.422. PMID: 22496266; PMCID: PMC4966670

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