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Síndrome Medular Lateral (Síndrome de Wallenberg)

A síndrome medular lateral (também conhecida como síndrome de Wallenberg, síndrome da artéria cerebelar inferior posterior (PICA, pela sigla em inglês) e síndrome da artéria vertebral) é uma constelação neurológica de sinais e sintomas causados pela obstrução nos vasos que suprem a medula, resultando em isquemia ou enfarto do tronco cerebral. A causa mais comum é a aterosclerose na circulação cerebral posterior, e o sintoma mais descrito é um acidente isquémico transitório (AIT) com tonturas ou vertigem. Simultaneamente aos acidentes vasculares cerebrais/enfartes, os doentes apresentam também náuseas e vómitos, perda de equilíbrio na marcha, instabilidade postural, rouquidão e dificuldade em engolir. Os sinais são dependentes dos núcleos e fibras específicos afetados. O diagnóstico é realizado com base no exame clínico e na imagem com TAC/RMN. O tratamento é principalmente de suporte, incluindo fonoaudiologia e terapia ocupacional após intervenção aguda, bem como redução de fatores de risco para futuros eventos isquémicos.

Última atualização: Jun 23, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Descrição Geral

Definição

O enfarte medular lateral (também conhecido como síndrome de Wallenberg, síndrome da artéria cerebelar inferior posterior (PICA, pela sigla em inglês) e síndrome da artéria vertebral) é uma constelação neurológica de sinais e sintomas devido à diminuição do fluxo sanguíneo nos vasos que suprem a medula, resultando em isquemia ou enfarte do tronco cerebral.

Anatomia

Componentes da medula lateral:

  • Pedúnculo cerebelar inferior
  • Núcleos vestibulares
  • Núcleo e trato trigeminal
  • Trato espinotalâmico
  • Fibras simpáticas descendentes
  • Núcleo ambíguo
  • Núcleo solitário
Cérebro e tronco cerebral - cerebelo

Localização do cerebelo em relação às outras estruturas do tronco cerebral

Imagem por Lecturio.

Vascularização:

  • Artérias vertebrais esquerda e direita → aspeto ventrolateral do tronco encefálico
  • PICAs esquerda e direita → medula lateral
    • Surgem das artérias vertebrais
    • A PICA supre o núcleo vestibular, trato espinotalâmico, núcleo trigeminal e o núcleo ambíguo.

Epidemiologia

  • Síndrome de acidente vascular cerebral isquémico mais prevalente: nos EUA, > 60.000 novos casos/ano
  • Mais comum em homens
  • Surge mais frequentemente na 6ª década de vida

Etiologia

  • AVC isquémico das
    • Artérias vertebrais
    • Artérias cerebelares posteriores inferiores
  • Fatores de risco:
    • Hipertensão arterial (o mais importante)
    • Aterosclerose de grandes artérias
    • Diabetes mellitus
    • Tabagismo
    • Dislipidemia
    • Idade avançada

Fisiopatologia

Ocorre redução completa do fluxo sanguíneo cerebelar que envolve a PICA, resultando na síndrome medular lateral.

  1. Oclusão da artéria intracraniana
  2. Redução do fluxo sanguíneo para a região que o vaso supre
  3. À medida que os neurónios são privados de glicose e oxigénio, o tecido cerebral começa a sofrer isquemia → falha na produção de ATP pelas mitocôndrias
  4. As bombas membranares de iões param de funcionar devido à falta de ATP e os neurónios despolarizam → o cálcio intracelular aumenta e o glutamato é libertado dos terminais pré-sináticos
  5. Excesso de glutamato extracelular induz maior captação de cálcio pelos neurónios → neurotoxicidade
  6. São produzidos radicais livres e acumulados dentro dos neurónios → destruição catalítica das membranas
  7. Se o fluxo sanguíneo não for restabelecido em poucos minutos, ocorrerá enfarte ou necrose do tecido cerebral.
  8. Os sintomas neurológicos tornam-se evidentes.

Apresentação Clínica e Diagnóstico

Apresentação clínica

A síndrome de Wallenberg causa alterações nos sistemas vestibulocerebelar, sensorial, bulbar, respiratório e autónomo.

  • Os sintomas mais comuns são vestibulocerebelares:
    • Vertigens, tonturas, sensação de desequilíbrio
    • Dificuldade em sentar
    • Visão turva ou diplopia
    • Instabilidade da marcha
  • Sintomas sensoriais:
    • Dor facial
    • Perda da sensação de dor e temperatura no tronco e membros contralaterais
  • Outros sintomas:
    • Náuseas e vómitos
    • Soluços
  • Fraqueza muscular bulbar
    • Rouquidão
    • Disfagia
  • Sintomas respiratórios: Maldição de Ondina = falha em iniciar a respiração
  • Sintomas autonómicos:
    • Síndrome de Horner
      • Miose
      • Ptose
      • Anidrose
    • Cardiovasculares
      • Hipotensão ortostática
      • Taquicardia
  • Sinais:
    • Nistagmo
    • Ataxia dos membros/prova dedo-nariz (+)
    • Hipotonia do braço ipsilateral
    • Diminuição ipsilateral da sensação de dor e temperatura na face
    • Perda contralateral da sensação de dor e temperatura no corpo e membros ao exame físico
    • Reflexo corneano diminuído no olho ipsilateral
Tabela: Características clínicas (dependentes dos núcleos e fibras específicas afetadas)
Estrutura afetada Sintomas à apresentação
Trato espinotalâmico Perda contralateral da sensação de dor e temperatura no tronco e membros
Núcleo espinhal do trigémeo Perda ipsilateral de dor e temperatura na face
Núcleo ambíguo Disfagia, disfonia e reflexo do vómito diminuído (o suprimento para os nervos vago e glossofaríngeo é afetado)
Núcleo vestibular inferior Vertigem (mesma direção da lesão), diplopia, nistagmo, vómito
Fibras simpáticas Síndrome de Horner = miose, ptose, anidrose
Pedúnculo cerebelar inferior Ataxia, dismetria, disdiadococinésia

Diagnóstico

  • Exame clínico como referido acima
  • Testes para distinguir vertigem do tronco cerebral e isquemia cerebelar de causas periféricas:
    • O teste do impulso cefálico, o nistagmo e o teste do desalinhamento ocular vertical (HINTS, pela sigla em inglês) avaliam a função vestíbulo-ocular:
      • HI = head impulse (impulso cefálico): O examinador gira a cabeça do doente rapidamente cerca de 15º enquanto o olhar do doente está fixo num alvo distante; uma resposta normal ocorre quando os olhos permanecem no alvo, enquanto uma resposta anormal ocorre quando os olhos são arrastados para fora do alvo pelo girar da cabeça, seguido por uma sacada corretiva de volta ao alvo.
      • N = nystagmus (nistagmo) que muda de direção com as diferentes posições do olhar (as lesões vestibulares periféricas têm nistagmo que ocorre sempre na mesma direção)
      • TS = test of skew (teste do desalinhamento ocular vertical): o examinador observa um deslocamento vertical no olho do doente quando o mesmo é coberto → descoberto.
    • Estes achados sugerem uma lesão do tronco cerebral ou do cerebelo:
      • Teste de impulso cefálico normal em ambos os lados
      • Nistagmo com mudança de direção
      • Desalinhamento ocular vertical
  • Imagem: TAC e/ou RMN para identificar a localização exata do enfarte
Síndrome medular lateral

Síndrome medular lateral: RMN a mostrar um enfarte agudo na medula dorsolateral esquerda

Imagem: “Lateral medullary syndrome” por John S. To, M.D. Licença: Public Domain

Tratamento

A intervenção e o tratamento rápidos são necessários para controlar a síndrome de Wallenberg de forma semelhante ao tratamento do acidente vascular cerebral isquémico. Os objetivos são reduzir o tamanho do enfarte e prevenir complicações médicas.

  • Manter:
    • Volémia
    • Oxigenação
    • Níveis normais de glicose no sangue (BGLs, pela sigla em inglês)
    • Temperatura corporal
  • Controlo da pressão arterial: sistólica < 220 e diastólica < 120
  • Fármacos antiplaquetários (e.g., aspirina)
  • Os anticoagulantes podem ser necessários se acidente vascular cerebral isquémico.
  • Deve ser fornecida terapêutica de suporte para a fala e para a deglutição.

Prevenção secundária de futuros AVCs com redução de fatores de risco:

  • Anticoagulação se fibrilhação auricular
  • Terapêutica antiplaquetária
  • Controlo de fatores de risco ateroscleróticos:
    • Hipertensão arterial
    • Diabetes
    • Dislipidemia
  • Cessação tabágica

Complicações:

  • Aspiração devido à fraqueza muscular bulbar e à acumulação de secreções na faringe
  • Pneumonia
  • Soluços
  • Síndrome de Locked-in
  • Mioclonias palatinas
  • Movimentos clónicos da mandíbula
  • Efeito pseudobulbar:
    • Labilidade emocional
    • Choro exagerado e crises de riso no enfarte da base da ponte

O prognóstico depende do tamanho e localização da área do AVC (extensão da medula danificada pela oclusão da PICA).

Diagnóstico Diferencial

  • Síndrome da dor crónica: condição mal definida, sendo a característica principal a dor com duração superior a 6 meses. A síndrome pode ser causada por trauma físico e/ou psicológico, infeções, doenças crónicas subjacentes ou condições autoimunes. O diagnóstico é baseado na história e nos achados clínicos. A gestão é realizada com uma combinação de fármacos e terapia.
  • AVC da artéria cerebral média (ACM): início súbito de défices neurológicos focais decorrentes de lesão isquémica em áreas do cérebro supridas pela ACM. Os doentes apresentam fraqueza, tonturas, parestesias, problemas com a fala ou alterações visuais. O diagnóstico e a avaliação são realizados com a ajuda de TAC ou RMN. O ativador do plasminogénio tecidual intravenoso (TPa, pela sigla em inglês) e a trombectomia são usados na intervenção aguda. Fármacos antiplaquetários ou anticoagulantes, bem como o tratamento agressivo de fatores de risco cardiovasculares, podem ser usados para prevenção secundária.
  • Esclerose múltipla (EM): doença autoimune do sistema nervoso central caracterizada por inflamação crónica, desmielinização, gliose e perda neuronal. Os doentes apresentam distúrbios visuais, vertigem, desequilíbrio na marcha, disartria, disfagia, tremor e perda de sensibilidade. Os doentes são diagnosticados pela história e achados clínicos e a RMN é realizada para confirmar os achados. O tratamento inclui fármacos modificadores de prognóstico.
  • Hemorragia subaracnoideia (HSA): extravasamento de sangue para o espaço subaracnoide entre a pia e as membranas aracnoides. Trauma, rutura de aneurismas saculares e rutura de malformações arteriovenosas (AV) são as causas mais comuns. Os doentes apresentam dor de cabeça, tonturas, distúrbios visuais, distúrbios sensitivos ou motores e convulsões. O diagnóstico é realizado através do exame clínico, da TAC com contraste e da punção lombar. O tratamento baseia-se em agentes osmóticos, diuréticos de ança, esteroides e cirurgia.

Referências

  1. Caplan, LR. (2021). Posterior circulation cerebrovascular syndromes. UpToDate. Retrieved August 11, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/posterior-circulation-cerebrovascular-syndromes
  2. National Institute of Neurological Disorders and Stroke. Wallenberg’s Syndrome Information Page. Retrieved August 11, 2021, from https://www.ninds.nih.gov/disorders/all-disorders/wallenbergs-syndrome-information-page
  3. Saleem, F, & Das, JM. (2021). Lateral medullary syndrome. StatPearls, StatPearls Publishing. PubMed. Retrieved August 11, 2021, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK551670/
  4. Lui, F, et al. (2021). Wallenberg’s syndrome. StatPearls, StatPearls Publishing. PubMed. Retrieved August 11, 2021, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470174/

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