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Prolapso de Órgão Pélvico

O prolapso de órgãos pélvicos (POP) é um termo geral que se refere à hérniação de 1 ou mais órgãos pélvicos (e.g., bexiga, útero, reto) através do canal vaginal e, potencialmente, até ao introito. A fraqueza e insuficiência do pavimento pélvico podem resultar em POP. Os principais fatores de risco são a paridade, antecedentes de parto vaginal, idade, obesidade e condições com aumento da pressão abdominal. As pessoas afetados tipicamente apresentam-se com uma sensação de pressão e de protuberância a nível vaginal, frequentemente com urgências urinária e defecatória associadas. O diagnóstico é clínico e o POP é classificado através, ou do sistema de estadiamento de Prolapso de Órgãos Pélvicos (POP-Q, pela sigla em inglês), ou do sistema de classificação de Baden-Walker. O tratamento é baseia-se nos desejos e sintomas da doente. A abordagem conservadora inclui pessários vaginais, exercícios de fortalecimento muscular pélvica e redução de fatores de risco modificáveis. A reparação cirúrgica é uma opção para doentes com sintomas mais graves.

Última atualização: Jan 11, 2024

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Descrição Geral

Definições

Prolapso de órgão pélvico (POP): termo geral referente ao prolapso de 1 ou mais órgãos pélvicos (por exemplo, bexiga, útero, reto) através do canal vaginal

  • Os órgãos prolapsam através do canal/orifício vaginal, empurrando a vagina com eles → os POPs classificam-se consoante a parede vaginal prolapsada e os órgãos atrás dessa parede
  • Prolapso do compartimento anterior:
    • Herniação da parede vaginal anterior e bexiga
    • Classicamente referido como cistocelo
  • Prolapso do compartimento posterior:
    • Herniação da parede vaginal posterior e reto
    • Classicamente referido como retocelo
  • Prolapso do compartimento apical:
    • Herniação do ápice da vagina, que corresponde ao/à:
      • Útero e colo do útero (anatomia normal)
      • Colo do útero (se a doente tiver realizado uma histerectomia supracervical)
      • Cúpula vaginal (se a doente tiver realizado uma histerectomia total)
    • Se o útero estiver presente, o prolapso é referido como prolapso uterino.
    • Se a doente não tiver útero, o intestino tipicamente prolapsa atrás da cúpula vaginal, classicamente conhecido como enterocelo.
  • Procidência: uma forma grave de POP que inclui herniação dos compartimentos vaginais anterior, posterior e apical através do intróito vaginal
Tipos de prolapso de órgãos pélvicos

Tipos de prolapso de órgão pélvico:
A parede vaginal é delineada com um rosa mais escuro. Observar como nos cistocelos e retocelos, a bexiga e o reto, respetivamente, empurram as paredes vaginais com herniação através do orifício vaginal. No prolapso apical, a vagina fica “enrugada”, como se mostra na imagem do prolapso uterino, e pode até everter completamente, como se mostra no enterocelo.

Imagem por Lecturio.

Visualização do POP

Visualizar um POP, especialmente o POP apical, pode ser difícil.

  • Imaginar como se estivesse a segurar uma meia pela região dos dedos dos pés:
    • A mão é o útero.
    • A meia é a vagina.
  • A parte aberta da meia está presa a um local fixo:
    • A parte aberta da meia é o introito vaginal.
    • A “localização fixa” é o pavimento pélvico.
  • Começar a mover a mão para baixo → a região inferior representa o prolapso apical/uterino
  • À medida que a mão desce através da abertura da meia, a meia começa a virar do avesso, o que é semelhante à forma como os órgãos prolapsados podem acabar completamente “fora” do corpo, mas ainda permanecem cobertos pela mucosa vaginal.

Etiologia

O prolapso deve-se à fraqueza e insuficiência do pavimento pélvico, que normalmente mantém os órgãos no lugar. Os fatores de risco incluem:

  • Paridade múltipla (o risco aumenta a cada nascimento)
  • Parto vaginal
  • Idade avançada
  • Menopausa
  • Aumento da pressão intra-abdominal:
    • Tosse crónica
    • Obesidade
    • Obstipação
  • Alterações do tecido conjuntivo (por exemplo, síndrome de Ehlers-Danlos)
  • História familiar
  • Histerectomia (controversa)

Epidemiologia

  • A prevalência exata dos prolapsos uterino e vaginal é incerta.
  • Pico de incidência: mulheres de 70 a 79 anos
  • Risco ao longo da vida de mulheres nos EUA submetidas a cirurgia para POP: 13%
  • Prevalência de POP com base nos sintomas relatados: 3%‒6%
  • Prevalência de POP identificada no exame objetivo: 40%‒50%
  • Mensagem chave: Muitas mulheres com POP ligeiro são assintomáticas e não necessitam de tratamento além da redução dos fatores de risco modificáveis para prevenir o desenvolvimento de sintomas (por exemplo, perda de peso, cessação tabágica).

Anatomia Cirúrgica e Patologia

Os órgãos pélvicos são sustentados pelo pavimento pélvico, tecido conjuntivo e pela pelve óssea. Além disso, a vagina apresenta 3 níveis de suporte ao longo do seu comprimento.

Diafragma pélvico

A camada mais interna do pavimento pélvico:

  • Funções:
    • Fornecer estrutura ao assoalho pélvico, separando a cavidade pélvica interna do períneo externamente
    • Resistência à pressão intra-abdominal
  • Estrutura:
    • Os músculos originam-se no arco tendinoso (abaixo e paralelos à margem inferior dos ossos púbicos).
    • Os músculos prolongam-se posteriormente em direção ao cóccix → “enrolam” a uretra, vagina e reto, fornecendo suporte lateral
    • Corpo perineal: o tendão central e local de fixação para os músculos do pavimento pélvico
  • Músculos do diafragma pélvico:
    • Um grupo de músculos coletivamente apelidados de músculos elevadores do ânus:
      • Puborretal: o músculo mais interno, originando-se do arco tendíneo, logo abaixo do osso púbico, que contorna o reto; em contacto direto com a parte lateral da vagina e a parte lateral e posterior do reto
      • Pubococcígeo: o músculo médio, que conecta o arco tendinoso/ossos púbicos ao cóccix
      • Iliococcígeo: a camada mais lateral, que conecta as espinhas isquiáticas ao cóccix
    • Coccígeo
  • Outros músculos do assoalho pélvico:
    • Piriforme
    • Obturador interno
Músculos do assoalho pélvico

Músculos do assoalho pélvico

Imagem por BioDigital, editada por Lecturio

Principais níveis de suporte vaginal e patologias associadas

  • Suporte de nível I:
    • O nível mais proximal de suporte
    • Consiste nos ligamentos uterossagrados que suspendem o útero e a parte superior da vagina ao sacro e na parede pélvica lateral
  • Suporte de nível II:
    • Inserções laterais de tecido conjuntivo ao longo do comprimento da vagina
    • Inserções paravaginais à fáscia endopélvica dos músculos elevadores do ânus que circundam a vagina
  • Suporte de nível III:
    • O nível de suporte mais distal
    • Consiste no períneo e nos músculos perineais
    • Suporta o terço distal da vagina
  • Patologias:
    • Perda do suporte de nível I → prolapso apical pela vagina
    • Perda do suporte de nível II → resulta mais frequentemente em prolapso da parede vaginal anterior e da bexiga (cistocelo)
    • Perda do suporte de nível III →
      • Anteriormente: hipermobilidade da uretra e incontinência
      • Posteriormente: parede vaginal posterior e prolapso retal
Níveis de suporte vaginal

Níveis de suporte vaginal:
Nível I: o nível mais proximal que suporta a parte superior da vagina. Consiste nos ligamentos uterossagrados que conectam a parte superior da vagina, localizada ao nível do colo do útero, ao sacro
Nível II: suporte ao longo do comprimento da vagina fornecido pela fáscia endopélvica que cobre os músculos elevadores do ânus. A fáscia insere-se no arco tendíneo dos músculos elevadores do ânus logo abaixo dos ossos púbicos.
Nível III: o nível de suporte mais distal. O nível III, composto pelos músculos perineais e pelo corpo perineal, suportam a parte inferior da vagina e o orifício vaginal.

Imagem por Lecturio.

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Apresentação Clínica

Mulheres com POP apresentam-se tipicamente com:

  • Sintomas vaginais:
    • Sensações de:
      • Plenitude vaginal
      • Pressão
      • Protuberância
      • “Algo a cair”
    • Os sintomas geralmente pioram com a atividade, valsalva e/ou no final do dia.
  • Sintomas urinários:
    • Esvaziamento incompleto da urina
    • Dificuldade em urinar
    • Incontinência urinária
  • Sintomas retais:
    • Obstipação
    • Esvaziamento incompleto
    • Splinting (digitação vaginal): colocar os dedos na vagina e empurrar para evacuar as fezes
    • Urgência fecal
    • Plenitude retal
  • Dor:
    • Dispareunia
    • Dor lombar e pélvica exacerbada pela atividade
    • Dor vaginal, quando o prolapso é grave e existe erosão ou ulcerações

Diagnóstico e Classificação

Diagnóstico

  • Com base no exame objetivo:
    • Inspeção
    • Exame com espéculo: Para avaliar o POP é melhor usar apenas uma única lâmina, para examinar as paredes anterior e posterior separadamente.
    • Exame pélvico bimanual: útil na avaliação do prolapso apical
    • Exame retovaginal
  • Avaliar a doente em repouso e durante a valsalva.
  • Notar:
    • Quais porções da vagina estão prolapsadas (por exemplo, parede anterior, parede posterior, ápice)
    • Até onde desce o prolapso (utilizar o hímen como ponto de referência)
    • Tónus retal
    • Mobilidade da uretra
  • Se não se observar um prolapso significativo em decúbito dorsal, examinar a doente em pé.
  • Os achados são reportados com base em:
    • Sistema de estadiamento POP-Q
    • Sistema de classificação Baden-Walker
  • Avaliar se a doente tem incontinência urinária de esforço (IUE):
    • Pedir à doente para tossir enquanto observa se há perdas pela uretra.
    • Deve ser avaliado quando o prolapso está reduzido (às vezes, especialmente os prolapsos anteriores, podem diminuir a IUE)
    • Considerar estudos urodinâmicos, sobretudo quando há um planeamento cirúrgico, para ver se um procedimento para tratamento da incontinência pode estar indicado concomitantemente.

Sistema de estadiamento POP-Q

A American Urogynecologic Society (AUGS) e a Society of Gynecologic Surgeons (SGS) recomendam a utilização do sistema de estadiamento POP-Q em vez do sistema Baden-Walker, uma vez que o primeiro é o único método validado para a medição objetiva de um prolapso.

  • O sistema POP-Q é melhor para:
    • Acompanhar a progressão do prolapso ao longo do tempo
    • Resposta ao tratamento
    • Padronização da investigação
  • O sistema POP-Q é utilizado para estadiar o prolapso com base em 9 medições:
    • 6 das medições comparam pontos definidos/fixos na vagina com o hímen durante a valsalva:
      • O hímen é definido como “0”.
      • A distância do hímen a cada ponto é medida em centímetros durante a valsalva.
      • Pontos proximais ao hímen (em direção ao útero) apresentam valores negativos.
      • Pontos distais ao hímen (em direção ao introito) apresentam valores positivos.
    • 3 medições adicionais são utilizadas para melhor compreensão.
Tabela: Classificação por estádios
Estádio 0 Sem prolapso
Estádio I A porção mais distal do prolapso está > 1 cm acima do hímen.
Estádio II A porção mais distal do prolapso está entre 1 cm ou menos, acima ou abaixo do hímen.
Estádio III A porção mais distal do prolapso está > 1 cm abaixo do hímen, mas não mais que 2 cm e menos que o CTV.
Estádio IV A vagina está completamente evertida (dentro de 2 cm de +CTV) ou ocorreu procidência uterina.
CTV: comprimento total da vagina
Pontos e pontos de referência para exame do sistema pop–q

Pontos e referências do sistema POP-Q:
O estádio é definido pelo maior número associado a cada compartimento. Por exemplo, se Aa = 0 e Ba = +2, então um indivíduo teria prolapso anterior de estadio 3.
As medições:
Comprimento total da vagina (CTV): a distância entre o hímen e o ponto mais profundo do fornix posterior (ponto D) se houver colo uterino, ou a cúpula vaginal (ponto C) se o colo do útero estiver ausente.
Aa: linha média da parede vaginal anterior, 3 cm proximal ao meato uretral externo
Ba: ponto mais baixo do prolapso de qualquer parte da parede vaginal anterior, que esteja entre o ponto Aa e o ápice vaginal; se não houver prolapso, definido como -3
Ap: linha média da parede vaginal posterior, 3 cm proximal à parte posterior do hímen
Bp: ponto mais baixo do prolapso de qualquer parte da parede vaginal posterior, que esteja entre o ponto Ap e o ápice vaginal; se não houver prolapso, definido como -3
C: distância do hímen ao colo do útero ou cúpula vaginal
D: ponto mais profundo do fornix posterior (medido apenas em mulheres com colo do útero)
Hiato genital (gh): a distância entre o meato uretral externo (anteriormente) e a linha média posterior do hímen
Corpo perineal (pb): a distância entre a linha média posterior do hímen e o ponto médio do orifício anal

Imagem : “Points and landmarks for POP–Q system examination” pelo Department of Urology, Sf.loan Clinical Emergency Hospital, Bucharest, Romania.. Licença: CC BY 2.0

Sistema de Classificação Baden-Walker

  • Um sistema mais fácil, mas menos preciso, para avaliação de um prolapso
  • Compara o ponto máximo atingido pelo prolapso com o hímen durante a valsalva
  • Todos os 3 compartimentos (anterior, posterior e ápice) devem ser avaliados e classificados separadamente
  • Classificação:
    • Grau 0: sem prolapso, posição normal para cada compartimento
    • Grau 1: desce até metade da distância até ao hímen
    • Grau 2: desce até ao hímen
    • Grau 3: desce mais de metade da distância após o hímen
    • Grau 4: desce o máximo possível
  • Nota: Os graus Baden-Walker são comparáveis com os estadios do POP-Q.
Uma mulher de 87 anos com prolapso uterino estágio iv

Uma mulher de 87 anos com um prolapso uterino estadio IV (POP-Q) e grau 4 (Baden-Walker)

Imagem : “An 87-year-old woman with uterine prolapse Stage IV” pelo Asama Vanichtantikul et al. Licença: CC BY 4.0

Tratamento

O tratamento do POP baseia-se no estádio/grau, sintomas e bem-estar geral do paciente. Todos os casos devem receber tratamento conservador. Algumas doentes com sintomas mais graves podem desejar cirurgia.

Tratamento conservador

  • Reduzir os fatores de risco modificáveis:
    • Perda de peso
    • Reduzir o esforço associado à defecação (ou seja, obstipação), através de mudanças na dieta e farmacologia.
    • Evitar fumar para reduzir a tosse crónica.
  • Exercícios de Kegel:
    • Treino muscular do assoalho pélvico
    • Geralmente utilizado como uma técnica de prevenção primária
    • Também auxilia no controlo da incontinência urinária
  • Pessário vaginal:
    • Um dispositivo médico à base de silicone ou látex que serve para inserir na vagina
    • Serve de suporte aos órgãos pélvicos e restaura a anatomia
    • Várias formas disponíveis (ver imagem)
    • Ajustar no consultório por um médico
    • Um creme com estrogénio vaginal é frequentemente utilizado como adjuvante para a prevenção de erosões vaginais.
    • Pode ser removido pelas doentes no domicílio, com a frequência que desejarem, ou a cada 3 a 6 meses por um médico no consultório
    • Indicações:
      • Todas as doentes com história de POP
      • IUE
      • Más candidatas à cirurgia
    • Complicações:
      • Erosões vaginais
      • Retenção urinária
Pessários

Diferentes tipos de pessários

Imagem : “Pessaries” pelo Huckfinne.  Licença: Domínio Público

Tratamento cirúrgico

Indicado nas doentes sintomáticas que expressarem vontade. Deve ser tido em conta que, a menos que o POP cause retenção urinária, a decisão pela cirurgia é motivada principalmente pelo desejo da doente após aconselhamento sobre riscos/benefícios/alternativas.

  • Cirurgia reconstrutiva:
    • Reparação anterior (colporrafia anterior): fortalecimento do “teto” da vagina, entre a vagina e a bexiga
    • Reparação posterior (colporrafia posterior): fortalecimento do “assoalho” da vagina, entre a vagina e o reto
    • Procedimentos com suspensão:
      • Para fixar partes da vagina, colo do útero e/ou útero às estruturas internas
      • Geralmente envolve suturas permanentes e/ou uso de prótese
      • Exemplos: sacrocolpopexia (do colo do útero ao sacro); suspensão do ligamento uterossagrado (suturas encurtam/apertam os ligamentos uterossagrados)
  • Cirurgia Obliterativa:
    • Obliteração cirúrgica/encerramento da vagina para evitar mais prolapsos
    • Reservado para mulheres que não desejam mais penetração vaginal e que não toleram cirurgias mais extensas
  • Complicações:
    • Risco de falha (pode chegar a 50% em alguns procedimentos)
    • Erosão da prótese, se esta for utilizada
    • Dor pélvica crónica, especialmente se foram utilizados “kits protésicos” durante um procedimento com suspensão
    • Lesão dos órgãos circundantes (por exemplo, bexiga, ureteres, uretra, intestino)
    • Hemorragia
    • Infeções

Referências

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