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Leptospira/Leptospirose

Leptospira é uma espiroqueta gram-negativa em forma de espiral ou ponto de interrogação com extremidades em forma de gancho. A doença, a leptospirose, é uma zoonose, que infeta animais. Os roedores são o principal reservatório. As bactérias eliminadas na urina de roedores e outros animais podem ser transmitidas aos humanos através da água contaminada. A principal espécie clínica é a Leptospira interrogans, que causa uma doença ligeira semelhante à gripe na maioria dos casos. As manifestações são bifásicas, sendo a Leptospira encontrada inicialmente no sangue. Na fase imune, as bactérias desaparecem da circulação sanguínea e podem ser detetadas na urina. Em cerca de 10% das infeções, desenvolve-se leptospirose icterohemorrágica, manifestando-se com hemorragia, insuficiência renal e icterícia. Podem ser utilizadas vários técnicas diagnósticas como testes serológicos e microscopia de campo escuro e ainda cultura bacteriana, que pode levar semanas a identificar o microorganismo. O tratamento de primeira linha é com penicilina.

Última atualização: May 17, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Características Gerais

Leptospira

  • Características:
    • Espiroqueta
    • Estrutura:
      • Espiral ou em forma de ponto de interrogação
      • Possui extremidades em forma de gancho (característica que diferencia a Leptospira de outras espiroquetas)
    • Necessidade de oxigénio: aeróbio
    • Coloração de Gram: Gram-negativo (coloração fraca)
    • Outra(s) colorações(s): coloração de prata
    • Microscopia:
      • Melhor visualizado com microscopia de campo escuro
      • Microscopia fluorescente
    • Cultura: necessário meio especial
  • Doenças associadas (zoonose):
    • Leptospirose (anictérica)
    • Doença de Weil (icterohemorrágica)

Espécies clinicamente relevantes

Existem tipos patogénicos (causadores de doenças) e saprofíticos (provenientes de matéria orgânica em decomposição, que geralmente não causam doenças). Os seguintes tipos são todos patogénicos:

  • L. interrogans (mais prevalente)
  • L. kirschneri
  • L. noguchii
  • L. alexanderi
  • L. weilii
  • L. alstonii
  • L. borgpetersenii
  • L. santarosai
  • L. kmetyi
  • L. mayotensis

Epidemiologia

  • 870.000 casos de leptospirose, dos quais 48.600 mortes, anualmente em todo o mundo
  • Doença com maior morbilidade e mortalidade no sul e sudeste da Ásia, Oceânia, Caraíbas, América Latina e África
  • A ausência de testes em diversas áreas dificulta o cálculo do número de casos de leptospirose.
  • Estados Unidos: maioria dos casos no Havai (128/100.000 habitantes por ano)
  • Picos de incidência:
    • Verão e outono nos hemisférios norte e sul
    • Estações chuvosas nos trópicos
Esfregaço de impressão de fígado de leptospira

Visualização de Leptospira, espiroqueta observada num esfregaço de amostra de fígado (corante fluorescente)

Imagem: “Leptospira bacteria in liver impression smear. FA stain.” por CDC/Mildred Galton. Licença: Public domain.

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Patogénese

Reservatórios

  • Os animais são infetados e podem ser assintomáticos.
  • Os animais infetados (apenas mamíferos) eliminam a Leptospira pela urina:
    • Roedores (reservatório mais importante)
    • Animais domésticos
    • Gado doméstico

Transmissão

  • Bactérias transmitidas por:
    • Água ou solo contaminados com urina ou sangue animal
    • Tecido animal infetado
  • Portas humanas de entrada:
    • Escoriações da pele
    • Membranas mucosas
    • Conjuntiva
    • Raramente, por ingestão de alimentos contaminados com urina
    • Infeção transplacentária (frequência desconhecida)
  • Período de incubação: 5 a 14 dias (pode chegar a 30 dias)

Virulência e processo de doença

  • Fatores bacterianos que afetam a patogenicidade:
    • Lipopolissacarídeo (LPS) (estímulo antigénico importante)
    • Hemolisinas (lisam eritrócitos e membranas celulares)
    • Reguladores do complemento (ajudam a evitar o sistema do complemento)
    • Fatores de adesão, como proteínas da membrana externa (ligam-se à matriz extracelular do hospedeiro (ECM))
    • Enzimas (hidrolisam ECM e algumas inativam o sistema complemento)
  • Processo da doença:
    • Fase leptospirémica/bacteriémica:
      • Uma vez no hospedeiro, as espiroquetas entram na circulação sanguínea (as bactérias podem ser isoladas em cultura de sangue).
      • As toxinas libertadas levam à rutura das paredes dos vasos e saída de fluido.
      • Duração frequentemente < 10 dias
    • Fase imune:
      • Nesta fase, os microorganismos deslocam-se do sangue para os tecidos.
      • As leptospiras estão ausentes no sangue, mas são encontradas na urina.
      • Os anticorpos de imunoglobulina M (IgM) e imunoglobulina G (IgG) direcionados contra o LPS de Leptospira são gerados pelo hospedeiro.
      • Estes anticorpos são opsoninas que aumentam a fagocitose.
  • Efeitos:
    • Inicialmente, a Leptospira na circulação sanguínea causa sintomas semelhantes aos da gripe.
    • A partir do sangue, as bactérias estabelecem-se noutras áreas, sobretudo em órgãos parenquimatosos.
    • Efeitos renais:
      • Insuficiência renal (Nefrite Túbulo Intersticial)
      • Hipocaliemia e hiponatremia devido à inibição do cotransportador sódio-cloreto de potássio (Na-K-Cl)
    • Efeitos hepáticos: lesão vascular nos capilares hepáticos e obstrução canalicular biliar (icterícia)
    • Efeitos pulmonares: dano capilar e hemorragia alveolar, síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA)
    • Efeitos hematológicos:
      • Hemólise
      • Trombocitopenia

Fatores de risco do hospedeiro

  • Condições de habitação e saneamento precárias (áreas infestadas de roedores)
  • Água contaminada em inundações após chuva
  • Atividades recreativas:
    • Natação em água doce
    • Atividades aquáticas
  • Ocupações com animais infetados e solo ou água contaminados

Apresentação Clínica

Leptospirose

  • Síndrome anictérica ligeira
  • Frequentemente evolução variável
  • Descrita como uma doença bifásica (fases leptospirémica e imune), mas pode ocorrer sobreposição de fases
  • 90% das doenças são ligeiras (geralmente desaparecem em < 10 dias)
  • Sintomas:
    • Febre, com sintomas semelhantes aos da gripe
    • Mialgias (sobretudo nos músculos gastrocnémios e tronco)
    • Diarreia, vómitos
    • Irritação cutânea
    • Cefaleia retroorbitária ou frontal
    • Fotofobia com hemorragia subconjuntival (eritema sem exsudato)
  • A recorrência dos sintomas e complicações são possíveis na fase imune.

Síndrome/doença de Weil

  • Leptospirose icterohemorrágica
  • Rara, mas grave, forma sistémica
  • Ocorre em 10% dos casos e tem uma taxa de mortalidade de até 40%
  • Apresenta uma tríade de:
    • Lesão renal
    • Icterícia (disfunção hepática, colestase)
    • Hemorragia
  • Associado à falência de múltiplos órgãos:
    • Miocardite (distúrbios de condução cardíaca)
    • Rabdomiólise (dor muscular, insuficiência renal)
    • SDRA (dispneia)
    • Hemorragia pulmonar (hemoptises)
Tabela: Comparação de doenças causadas por Leptospira
Características Leptospirose Síndrome de Weil (leptospirose icterohemorrágica)
Apresentação Infeção ligeira semelhante à gripe Forma grave
População em risco Prevalente em surfistas e nos trópicos Desenvolve-se em 10% dos pacientes infetados
Sinais e sintomas
  • Mialgias (sobretudo ao nível dos músculos gastrocnémios)
  • Irritação na pele
  • Fotofobia com sufusão conjuntival (eritema sem exsudato)
  • Cefaleia
  • Icterícia (disfunção hepática)
  • Azotemia (disfunção renal)
  • Hemorragias, colapso vascular
  • Anemia
Diagnóstico Pesquisa dos microorganismos na urina.
Tratamento
  • Penicilina ou eritromicina
  • Doxiciclina para prevenção pós-exposição
Leptospirose de sufusão conjuntival

Imagem das alterações oculares da leptospirose: são observadas hemorragia subconjuntival e icterícia.

Imagem: “Conjunctival suffusion of the eyes due to leptospirosis” por Daniel Ostermayer. Licença: CC BY 4.0.

Diagnóstico

Testes para identificação de Leptospira

Serologias:

  • O título de anticorpos pode ser detetado na 2ª semana.
  • Confirmação serológica da infeção: aumento no título por um fator de 4
  • Outros testes:
    • Teste de aglutinação microscópica (MAT) (o teste mais específico)
    • Teste de imunoabsorção enzimática (ELISA)

Isolamento de leptospiras (sangue, urina, tecido ou líquido cefalorraquidiano (LCR)):

  • Reação em cadeia da polimerase (PCR): pode confirmar o diagnóstico a partir de amostras de sangue no início da doença
  • Visualização por microscopia de campo escuro
  • Cultura:
    • Ellinghausen-McCullough-Johnson-Harris (meio mais frequentemente usado)
    • O crescimento leva entre 2 semanas a 3 meses (mais utilizado para diagnóstico retrospetivo)

Exames adicionais

  • Úteis se envolvimento de múltiplos órgãos
  • Testes laboratoriais:
    • Hemograma completo (↑ glóbulos brancos, ↓ hemoglobina, ↓ plaquetas)
    • Função renal (creatinina alterada)
    • Testes de função hepática (↑ transaminases, ↑ bilirrubina)
    • ↓ potássio, ↓ sódio
    • Marcadores inflamatórios elevados (proteína C reativa, procalcitonina, velocidade de sedimentação)
    • LCR (glicose normal, pleocitose linfocítica ou neutrofílica)
  • Radiografia do tórax obtida com envolvimento pulmonar:
    • Padrão alveolar irregular nos lobos inferiores (sugestivo de hemorragia)
    • Pode evidenciar opacidades em vidro fosco se associado a SDRA

Tratamento

Tratamento

  • Leptospirose grave:
    • Penicilina intravenosa (IV)
    • Outras opções: cefalosporinas, macrólidos, doxiciclina
  • Casos ligeiros:
    • Amoxicilina/doxiciclina/azitromicina
  • Tratamento de suporte agressivo com envolvimento de múltiplos órgãos:
    • Ressuscitação com fluidoterapia e reposição de eletrólitos
    • Diálise na insuficiência renal grave
    • Ventilação mecânica na insuficiência respiratória por SDRA ou hemorragia pulmonar

Prevenção

  • Melhoria das condições de habitação, infraestrutura e saneamento.
  • Planos de controlo de roedores invasores e projetos de mitigação de inundações
  • Uso adequado de equipamentos de proteção individual (EPI) por pessoas com alto risco de exposição ocupacional
  • Profilaxia com doxiciclina semanal se história de exposição em área endémica

Diagnósticos Diferenciais

  • Dengue: doença causada pelo vírus da dengue, que se transmite para os seres humanos através de picadas de mosquitos (espécies de Aedes infetadas). A dengue manifesta-se com febre, mialgias e erupções cutâneas e a maioria dos pacientes recupera espontaneamente. Nos casos graves, a dengue evolui para hemorragia interna e choque. A pesquisa de anticorpos específicos e deteção de sequências genómicas virais por RT-PCR permitem diferenciar da doença viral.
  • Hepatite viral: infeção vírica que causa uma reação inflamatória aguda no fígado. Apresenta-se com icterícia, febre e hepatomegalia, mas as transaminases geralmente são > 1.000 nos casos de hepatite viral. A diferenciação é estabelecida pela deteção de antigénios virais e anticorpos no soro. O tratamento é baseado na etiologia. Em alguns tipos de hepatite, a prevenção é alcançada pela vacinação.
  • Hantavírus: vírus disseminado principalmente por roedores, que se transmite aos humanos através da aerossolização do vírus, que se propaga na urina, fezes e saliva. A infeção contempla várias formas de apresentação como síndrome pulmonar por hantavírus (HPS) ou febre hemorrágica com síndrome renal (HFRS). Os testes serológicos ajudam a distinguir infeção por hantavírus da leptospirose.

Referências

  1. Day, N., Calderwood, S., & Baron, E. (2019), Leptospirosis: Epidemiology, microbiology, clinical manifestations and diagnosis. UpToDate. Retrieved Dec 13, 2020, from https://www.uptodate.com/contents/leptospirosis-epidemiology-microbiology-clinical-manifestations-and-diagnosis
  2. Day, N., Calderwood, S., Edwards, M., & Baron, E. (2020). Leptospirosis: Treatment and prevention. UpToDate. Retrieved Dec 13, 2020, from https://www.uptodate.com/contents/leptospirosis-treatment-and-prevention
  3. DeBrito, T., Goncalves da Silva, A., & Abreu, P. (2018). Pathology and pathogenesis of human leptospirosis: A commented review. Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo vol.6. https://doi.org/10.1590/s1678-9946201860023
  4. Evangelista, K., & Coburn, J. (2010). Leptospira as an emerging pathogen: A review of its biology, pathogenesis and host immune responses. Future Microbiol, 5(9): 1413–1425. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3037011/
  5. Fraga, T., Isaac, L., & Barbosa, A. (2016). Complement evasion by pathogenic Leptospira. Frontiers in Immunology. https://doi.org/10.3389/fimmu.2016.00623
  6. Riedel S, Hobden J.A., Miller S, et al. (Ed.) (2019). Spirochetes: Treponema, Borrelia, and Leptospira. In Jawetz, Melnick, & Adelberg’s Medical Microbiology, 28th ed. McGraw-Hill.
  7. Southwick, F.S. (2020). Emerging bacterial infections (including zoonotic pathogens and biological weapons). In Southwick F.S.(Ed.), Infectious Diseases: A Clinical Short Course, 4th ed. McGraw-Hill.
  8. Sun, A., Liu, X., & Yan, J. (2020). Leptospirosis is an invasive infectious and systemic inflammatory disease. Biomedical Journal 43(1): 24–31. https://doi.org/10.1016/j.bj.2019.12.002
  9. Wagenaar J.P., & Goris M.A. (2018). Leptospirosis. In Jameson JL, et al. (Ed.), Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20th ed. McGraw-Hill.

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