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Distrofia Muscular de Becker

A distrofia muscular de Becker (BMD) é uma doença genética recessiva ligado ao cromossoma X, causado por uma mutação no gene DMD. É produzida uma proteína da distrofina muscular anormal, parcialmente funcional, que leva à fraqueza muscular progressiva e à perda eventual de capacidade da marcha. A evolução clínica é altamente variável, mas os sintomas geralmente aparecem na adolescência. O diagnóstico é estabelecido com base nos valores de enzimas musculares, testes genéticos e biópsia muscular (se necessária). O tratamento da BMD é de suporte e visa retardar a progressão da doença assim como das suas complicações. A miocardiopatia dilatada é a principal causa de morte.

Última atualização: May 12, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Descrição Geral

Epidemiologia

A distrofia muscular de Becker (BMD) é a 2ª forma mais comum de distrofia muscular.

  • Presente quase exclusivamente no sexo masculino
  • Prevalência mundial: 0,1-1,8 por cada 10.000 nascimentos masculinos

Etiologia

A distrofia muscular de Becker é causada por uma mutação de deleção ou duplicação non-frameshift do gene DMD no braço curto do cromossoma X.

  • O DMD é o maior gene humano conhecido codificador de proteínas, estando associado a um aumento do risco de mutações.
  • A maioria dos casos são herdados num padrão recessivo ligado ao cromossoma X de uma mãe portadora.
  • Alguns casos ocorrem a partir de mutações de novo.

Fisiopatologia

Fisiologia normal:

  • O gene DMD codifica a proteína da distrofina normal, essencial para a estabilidade estrutural das miofibrilas.
  • A distrofina forma um grande complexo glicoproteíco (complexo de glicoproteínas associadas à distrofina):
    • Atua como um vínculo mecânico entre o citoesqueleto e a matriz extracelular do músculo
    • Permite a função muscular normal

Fisiopatologia na BMD:

  • Uma mutação no gene DMD codifica proteína da distrofina anormal, mas parcialmente funcional.
  • Proteínas da distrofina parcialmente funcionais → Complexo glicoproteico parcialmente funcional → Ligações mecânicas parcialmente funcionais entre o citoesqueleto e a matriz extracelular do músculo
  • Perda parcial de proteínas da distrofina → ↑ suscetibilidade a dano e necrose das miofibrilas
  • Tentativas inadequadas de regeneração das miofibrilas → substituição do músculo por tecido fibroso e adiposo

Apresentação Clínica

Linha temporal

A distrofia muscular de Becker tem uma apresentação altamente variável.

  • Os sintomas clínicos podem apresentar-se entre os 5 e 60 anos, mas, na maioria das vezes, estão presentes na adolescência.
  • A maioria dos pacientes perde a capacidade da marcha por volta dos 20 anos.
  • A morte ocorre frequentemente por volta dos 40 anos e é habitualmente causada por miocardiopatia dilatada.
  • Os pacientes com doença menos grave podem ter uma esperança média de vida semelhante a uma pessoa sem a doença.

Apresentação

A distrofia muscular de Becker cursa com fraqueza muscular lentamente progressiva, num padrão de proximal para distal.

Sintomas:

  • Cãibras musculares após atividade extenuante
  • Dificuldade em andar e correr
  • Dificuldade em subir escadas e saltar
  • Cansaço fácil
  • Marcha em bicos de pé

Achados do exame objetivo:

  • Hipotonia
  • Hiporreflexia
  • Fasciculações
  • Lordose lombar
  • Sinal de Gower
    • Uso dos braços e mãos como apoio para se colocar na posição de pé
    • É consequência da fraqueza muscular proximal
  • Pseudo-hipertrofia dos músculos gastrocnémios
    • Músculos grandes, mas fracos
    • Consequência da substituição do músculo por tecido fibroso e adiposo
  • Encurtamento do tendão de Aquiles e contraturas

Diagnóstico

Enzimas musculares

  • ↑ CK (creatina cinase)
    • Tipicamente 5-10 vezes o limite superior do normal
    • Pico por volta dos 10-15 anos e declínio à medida que o músculo é substituído por gordura e tecido fibroso
  • ↑ Aldolase
  • ↑ AST ( Aspartato aminotransferase) e ALT (Alanina aminotransferase)

Testes genéticos

  • Suficiente para estabelecer o diagnóstico
  • Avaliação das deleções e duplicações do gene DMD
  • Técnicas:
    • Amplificação de sondas dependentes de ligações múltiplas (MLPA)
    • FISH – hibridização fluorescente in situ
    • PCR – reação em cadeia da polimerase

Biópsia muscular

  • Indicada se os testes genéticos não confirmam a mutação, mas permanece uma alta suspeita clínica
  • Achados:
    • Fibras musculares necróticas de diversos tamanhos
    • Substituição de músculo por gordura e tecido fibroso
    • Distrofina na técnica de immunostaining
Exame histopatológico na distrofia muscular de becker

Biópsia muscular na distrofia muscular de Becker:
O exame histopatológico mostra fibras musculares necróticas com substituição por tecido fibroso e adiposo (A). A técnica de immunostaining mostra positividade parcial para a distrofina na distrofia muscular de Becker (B) em comparação com o músculo normal (C).

Imagem: “Histopathological examination” por Jing Miao et al. Licença: CC BY 4.0

Eletromiografia

  • Não é frequentemente usada para diagnóstico, mas pode ajudar a diferenciar a BMD de outras formas de fraqueza muscular.
  • Apresenta potenciais polifásicos pequenos

Rastreio cardíaco

  • Eletrocardiograma: deteta anomalias de condução
  • Ecocardiograma: avaliação para miocardiopatia dilatada

Tratamento

Não existe tratamento curativo para a BMD. O tratamento é dirigido a medidas de suporte e cuidados paliativos.

Tratamento geral

  • É necessário um cuidado multidisciplinar.
  • Fisioterapia
  • Apoio à mobilidade
  • Suporte nutricional

Terapêutica médica

  • Corticoides:
    • A evidência do seu uso na BMD é limitada.
    • O objetivo é retardar a progressão da fraqueza muscular.
  • Terapêuticas em investigação:
    • Terapia genética
    • Terapia celular

Tratamento cirúrgico

  • Cirurgia é indicada para alívio de tendões em contraturas
  • Tratamento da escoliose

Cuidados paliativos e planeamento atempado

  • Os pacientes e as famílias devem ser informados sobre o prognóstico a longo prazo.
  • Abordar questões de fim de vida.
  • As medidas paliativas podem ser usadas em qualquer fase da doença.

Complicações

  • Cardíacas:
    • A fibrose do músculo cardíaco leva a:
      • Miocardiopatia dilatada
      • Anomalias de condução e arritmias
    • A insuficiência cardíaca em consequência da miocardiopatia dilatada é a causa mais comum de morte.
    • O atingimento cardíaco é mais comum do que na distrofia muscular de Duchenne.
  • Respiratórias:
    • Função pulmonar progressivamente afetada devido a:
      • Fraqueza muscular do diafragma e músculos da parede torácica
      • Postura anormal em consequência da escoliose
    • A ventilação assistida pode ser necessária.
    • Risco aumentado para pneumonia
  • Ortopédicas:
    • Escoliose
    • Fracturas secundárias a quedas
    • Contraturas
  • Neurocognitivas:
    • Défice cognitivo
    • Menos comum do que na distrofia muscular de Duchenne

Diagnóstico Diferencial

  • Distrofia muscular de Duchenne (DMD): a forma mais comum e mais grave de distrofia muscular. A distrofia muscular de Duchenne ocorre devido a uma mutação frameshift recessiva ligada ao cromossoma X no gene DMD, que produz proteína da distrofina anormal. Esta doença é mais grave do que a BMD, com um início mais precoce de sintomas, progressão clínica mais rápida e esperança média de vida mais curta. O diagnóstico é baseado em valores da CK significativamente elevado, testes genéticos e biópsia muscular. O tratamento é de suporte.
  • Distrofia facioscapuloumeral: doença autossómica dominante resultante de mutações nos genes DUX4 ou SMCHD1. Afeta tanto crianças do sexo feminino como masculino. Os pacientes apresentam-se com fraqueza progressiva da face, escápula e músculos do antebraço por volta dos 20 anos. O atingimento cardíaco é raro. Há uma elevação modesta da CK e o diagnóstico é confirmado por testes genéticos. O tratamento é de suporte.
  • Distrofia muscular congénita: grupo de doenças genéticas recessivas, na sua maioria autossómicas. Início ao nascimento ou durante a infância. Os sintomas incluem hipotonia, atraso no desenvolvimento motor, fraqueza muscular progressiva e contraturas. O diagnóstico é confirmado por testes genéticos e o tratamento é de suporte.
  • Distrofia muscular de membro-cintura (“Limb-Girdle”): grupo de doenças miopáticas resultantes de vários defeitos genéticos. Afeta tanto crianças do sexo feminino como masculino. O início da doença varia e caracteriza-se pela atrofia e fraqueza lentamente progressiva dos músculos proximais do quadril e ombro. O atingimento cardíaco não é típico. O diagnóstico é confirmado por testes genéticos. O tratamento é de suporte.
  • Distrofia miotónica: grupo de doenças autossómicas dominantes que podem afetar diversos sistemas. A distrofia miotónica pode ser congénita ou ter início na idade adulta. Os achados clínicos incluem miotonia, perda de massa muscular distal e facial, cataratas, défice cognitivo e doenças endócrinas. O diagnóstico é baseado em testes genéticos e o tratamento é principalmente de suporte.
  • Distrofia muscular de Emery-Dreifuss: doença genética com várias formas de transmissão hereditária. A doença é caracterizada por fraqueza lentamente progressiva dos braços e pernas, contraturas e anomalias cardíacas na primeira ou segunda década de vida. Pode-se observar uma elevação moderada da CK. O diagnóstico é confirmado através de testes genéticos. O tratamento é de suporte e a maioria dos indivíduos não perde a capacidade de marcha.
  • Atrofia muscular espinhal: grupo de doenças autossómicas recessivas que levam à degeneração das células do corno anterior da medula espinhal e do tronco cerebral. A apresentação clínica é variável. As formas mais graves de atrofia muscular espinhal podem estar presentes desde o nascimento até à infância precoce com evidência de fraqueza progressiva, atrofia muscular, atraso motor grave, atrofia e fasciculações da língua, disfagia e insuficiência respiratória. O diagnóstico é confirmado com base em testes genéticos. O tratamento é de suporte e a esperança média de vida varia conforme o tipo de doença.

Referências

  1. Nair, D. (2019). Dystrophinopathies. Medcape. Retrieved February 21, 2021, from https://emedicine.medscape.com/article/1173204-overview#a2
  2. National Institutes of Health. (2018). Spinal Muscular Atrophy. https://rarediseases.info.nih.gov/diseases/7674/spinal-muscular-atrophy
  3. Centers for Disease Control and Prevention. (2020). What is Muscular Dystrophy? https://www.cdc.gov/ncbddd/musculardystrophy/facts.html
  4. Darras, B.T. (2021). Duchenne and Becker Muscular Dystrophy. UpToDate. Retrieved February 21, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/duchenne-and-becker-muscular-dystrophy-genetics-and-pathogenesis
  5. Darras, B.T. (2020). Duchenne and Becker muscular dystrophy: Clinical features and diagnosis. In Dashe, J.F. (Ed.), Uptodate. Retrieved February 28, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/duchenne-and-becker-muscular-dystrophy-clinical-features-and-diagnosis
  6. Darras, B.T. (2020). Duchenne and Becker muscular dystrophy: Management and prognosis. In Dashe, J.F. (Ed.), UpToDate. Retrieved February 28, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/duchenne-and-becker-muscular-dystrophy-management-and-prognosis

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