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Actinomyces/Actinomicose

Actinomyces é um bastonete anaeróbio, Gram-positivo, ramificado e filamentoso. Actinomyces israelii é a espécie mais comum envolvida em doenças humanas. O microorganismo é frequentemente encontrado na flora normal da cavidade oral, trato gastrointestinal e reprodutivo. A doença ocorre quando o microorganismo é transferido e ultrapassa a barreira mucosa, como por exemplo através de um pequeno trauma ou procedimento. Zonas de baixo oxigénio favorecem a multiplicação do microorganismo. Actinomyces está associado à infeção cervicofacial, que forma tratos sinusais de drenagem. Pode ainda afetar as regiões torácica, abdominal e pélvica. A drenagem ou o tecido infetado podem apresentar os grânulos amarelos de enxofre característicos, associados a Actinomyces. O tratamento consiste em antibioterapia com penicilina a longo prazo e cirurgia, se necessário.

Última atualização: Apr 7, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Classificação

Fluxograma de microbiologia classificação de bactérias gram-positivas

Bactérias gram-positivas:
A maioria das bactérias pode ser classificada de acordo com um procedimento de laboratório chamado coloração de Gram.
As bactérias com paredes celulares que possuem uma camada espessa de peptidoglicano retêm a coloração de cristal violeta utilizada na coloração de Gram, mas não são afetadas pela contracoloração de safranina. Estas bactérias aparecem azul-púrpura na coloração, o que indica que são gram-positivas. As bactérias podem ainda ser classificadas de acordo com a morfologia (filamentos ramificados, bacilos e cocos em aglomerados ou cadeias) e capacidade de crescer na presença de oxigénio (aeróbio versus anaeróbio). Os cocos também podem ser identificados. Os estafilococos podem ser reduzidos com base na presença da enzima coagulase e na sua sensibilidade ao antibiótico novobiocina. Os estreptococos são cultivados no meio agar de sangue e classificados com base no padrão de hemólise (α, β ou γ). Os estreptococos são ainda mais reduzidos com base na sua resposta ao teste de pirrolidonil-β-naftilamida (PYR), sensibilidade a antimicrobianos específicos (optoquina e bacitracina) e capacidade de crescer em meio de cloreto de sódio (NaCl).

Imagem por Lecturio. Licença: CC BY-NC-SA 4.0

Características Gerais

Actinomyces

  • Características gerais:
    • Estrutura: ramificada, bastonetes filamentosos
    • Coloração de Gram: Gram-positivo
    • Outro(s) corante(s): não ácido-resistente
    • Formação de esporos: não (ao contrário de Actinomyces dos fungos)
    • Necessidade de oxigénio: anaeróbio
  • Meio de cultura: o mesmo que para outros anaeróbios
  • Actinomicose (doença):
    • Infeção crónica supurativa e granulomatosa
    • Associado à formação de abcesso com tratos sinusais interconectados
    • Grânulos de enxofre:
      • Achado característico
      • Microcolónias da bactéria com coloração amarelada (sem enxofre), rodeadas de substância polimérica extracelular
      • Encontrados em elementos de tecido

Espécies clinicamente relevantes

  • A. israelii (mais comum)
  • A. gerencseriae
  • A. naeslundii
  • A. viscoso
  • A. odontolyticus
  • A. meyeri
Actinomyces naeslundii

Alterações histopatológicas de abcesso cerebral devido à bactéria A. naeslundii (em coloração de prata). São observados bacilos ramificados.

Imagem : “Actinomyces naeslundii 01” por CDC/Dr. Lucille Georg. Licença: Domínio Público

Epidemiologia

  • Homens > mulheres
  • Maior prevalência em regiões com nível socioeconómico baixo e má higiene dentária
  • A utilização do dispositivo intrauterino (DIU) aumenta a incidência em mulheres.

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Patogénese

Reservatório e transmissão

Reservatório:

  • Flora normal:
    • Cavidade oral
    • Sistema reprodutivo
    • Trato gastrointestinal (GI)

Transmissão:

  • O microorganismo é transferido e dissemina-se através de um pequeno trauma ou procedimento.
  • A penetração na barreira mucosa e deslocação para áreas com baixo oxigénio (ambiente anaeróbio) facilitam a sua multiplicação.

Fatores de risco

  • Má higiene oral
  • Gengivite
  • Cirurgia dentária
  • Traumatismo dentário
  • Uso de DIU
  • Alcoolismo
  • Desnutrição
  • Malignidade e dano tecidual local relacionado (da doença ou do tratamento com radiação)
  • Diabetes
  • Osteonecrose da mandíbula por bisfosfonatos

Fisiopatologia

  • As bactérias invadem os tecidos vizinhos através da rutura da mucosa.
  • Uma vez estabelecida a infeção por Actinomyces , segue-se a resposta inflamatória (supurativa e granulomatosa).
  • A infeção propaga-se ao criar seios que contêm grânulos de enxofre; estes podem drenar para a superfície.
  • As infeções ocorrem perto do reservatório habitual.
  • As infeções pulmonares ocorrem por extensão direta da fonte orofaríngea ou por aspiração de secreções orais e gastrointestinais.
Patogênese de actinomyces

Patogénese de Actinomyces
Quando há rutura da barreira mucosa, as bactérias Actinomyces da orofaringe (que se dirige para as vias respiratórias), trato GI e trato reprodutivo causam infeção e disseminam-se para tecidos contíguos enquanto geram tratos sinusais.

Imagem por Lecturio.

Apresentação Clínica

Doença cervicofacial

  • Apresentação mais comum
  • Abcessos orais/faciais na mandíbula (“mandíbula irregular”), que drenam através dos tratos sinusais
  • Afeta principalmente a maxila, bochecha e mandíbula
  • Apresenta grânulos amarelos de enxofre característicos em pús ou tecidos:
    • Assemelham-se a grãos de areia
    • Microcolónias bacterianas
  • Pode disseminar-se para outros tecidos, ossos e nódulos linfáticos
  • Manifestações:
    • Trismus e dificuldade na mastigação
    • A dor ocorre com a compressão das estruturas vizinhas.
  • Frequentemente associado a cáries dentárias, extrações ou traumatismo mandibular

Actinomicose torácica

  • Transmissão:
    • Aspiração de secreções orofaríngeas
    • Introdução de bactérias via lesão esofágica
    • Extensão direta do pescoço ou abdómen
    • Disseminação hematogénica
  • Manifesta-se como infeção pulmonar subaguda: febre, tosse produtiva
  • Parênquima pulmonar: pode ter cavitações, que podem formar tratos sinusais
  • Os tratos formados podem atravessar a parede torácica ou invadir a grelha costal.

Actinomicose abdominal

  • Em apêndice/intestino que sofreu rutura ou úlcera
  • O paciente pode ter história de cirurgia abdominal prévia.
  • Manifesta-se com febre, alterações gastrointestinais, dor abdominal, perda de peso
  • A extensão pode afetar qualquer órgão intra-abdominal.

Actinomicose pélvica

  • Em pacientes com DIU
  • Pode apresentar-se com dor abdominal nos quadrantes inferiores e corrimento vaginal
  • Pode causar abcessos pélvicos

Diagnóstico e Tratamento

Diagnóstico

  • Cultura:
    • Meios e técnicas de cultura: o mesmo que para outros anaeróbios
    • Incubação prolongada (às vezes leva cerca de 7 a 21 dias a crescer)
    • Amostra(s):
      • Pús (de drenagem dos seios nasais)
      • Expetoração
      • Amostras de tecido (com grânulos de enxofre amarelo-laranja microscópicos)
    • Em alguns casos, Actinomyces é observada na citologia cervico-vaginal (“Papanicolau”).
      • Se sintomático: o DIU é removido e enviado para cultura.
      • Se assintomático: O paciente deve vigiar o aparecimento dos sintomas a serem observados e o DIU não é removido.
  • Exame microscópico dos grânulos de enxofre: são visualizados elementos teciduais e filamentos actinomicóticos ramificados (em forma de taco na periferia)
  • Exames de imagem:
    • Tomografia computadorizada (TC) do abdómen: evidencia o local e a extensão da doença na infeção abdominal
    • TC do tórax:
      • Avalia infeção torácica
      • Presença de massa com áreas centrais atenuadas e realce em anel
      • Podem ainda ser observadas cavidades.
    • Ecografia pélvica:
      • Obtida quando os pacientes apresentam clínica de doença inflamatória pélvica
      • Pesquisar presença de abcesso
Osteonecrose da mandíbula associada a actinomyces

Osteonecrose da mandíbula associada a Actinomyces
(a) Coloração com hematoxilina e eosina de um agregado composto por filamentos, nomeadamente os grânulos de enxofre (#). Estes grânulos aparecem macroscopicamente como grânulos amarelos cercados por granulócitos neutrofílicos (*) e uma trabécula óssea necrótica (+, ampliação x 100).
(b) Os grânulos (#) coram com ácido periódico-Schiff (PAS) – positivo (ampliação x 200).
(c) Elevada ampliação a destacar estrutura filamentosa (#, morfologia de raios solares) dos microorganismos (ampliação x 400). (d) Padrão de crescimento típico de Actinomyces spp. em cultura microbiológica.

Imagem : “The association of medication-related osteonecrosis of the jaw with Actinomyces spp. infection” por Scientific Reports. Licença: CC BY 4.0

Tratamento

  • Tratamento prolongado com penicilina
    • Doença ligeira: 2-6 meses
    • Doença grave: 6-12 meses
  • Alternativas nos pacientes alérgicos à penicilina: clindamicina ou eritromicina
  • Podem ser necessárias incisão cirúrgica e drenagem.
  • Remoção do DIU

Comparação

Principais diferenças entre dois bastonetes gram-positivos, ramificados e filamentosos clinicamente relevantes:

Fatores de diferenciação Actinomyces Nocardia
Necessidade de oxigénio anaeróbio Aeróbio
Coloração ácido-resistente Não ácido-resistente Ácido-resistente (parcialmente)
Reservatório/habitat Flora oral, GI e reprodutiva normal Encontrado no solo, água, matéria orgânica em decomposição
Infeções
  • Abcessos orofaciais, associados a cárie dentária ou trauma facial
  • Tratos sinusais
  • Doença inflamatória pélvica
  • Infeção pulmonar em pacientes imunodeprimidos (pode disseminar-se por via hematogénica e originar abcessos)
  • Lesões cutâneas em pacientes imunocompetentes
Tratamento Penicilina Trimetoprim-sulfametoxazol

Mnemónica:

SNAP (Sulfonamidas-Nocardia, Actinomyces-Penicilina)

Diagnósticos Diferencial

  • Apendicite: apresenta-se com dor e sensibilidade abdominal, sobretudo ao nível da fosse ilíaca direita. A tomografia computadorizada pode ajudar a diagnosticar apendicite. A actinomicose abdominal pode ocorrer se a apendicite for complicada com rutura.
  • Abcesso/infeção odontogénica: surge após a extração dentária ou de um dente infetado. Geralmente são infeções polimicrobianas; as bactérias mais comuns são Streptococcus viridians, Peptostreptococcus e Staphylococcus. A cultura permite identificar os microorganismos.
  • Doença inflamatória pélvica: as bactérias mais comuns envolvidas nesta doença são Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae. As infeções de ambos os microorganismos são sexualmente transmissíveis. A actinomicose é frequentemente associada ao uso de DIU.

Referências

  1. Riedel S, Hobden JA, et al (Eds.) (2019). Infections caused by anaerobic bacteria. In Jawetz, Melnick, & Adelberg’s Medical Microbiology (28th ed.) McGraw-Hill. 
  2. Russo TA. (2018). Actinomycosis. In Jameson J, Fauci AS, et al (Eds.), Harrison’s Principles of Internal Medicine (20th ed.) McGraw-Hill.
  3. Ryan KJ (Ed.) (2017). Actinomyces and nocardia. In Sherris Medical Microbiology (7th ed.) McGraw-Hill.
  4. Sharma S, Hashmi M, Valentino D. (2020). Actinomycosis. StatPearls. Retrieved Nov 25, 2020, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK482151/
  5. Valour F, Sénéchal A, et al (2014). Actinomycosis: etiology, clinical features, diagnosis, treatment, and management. Infect Drug Resist, 7, 183–197. https://dx.doi.org/10.2147%2FIDR.S39601

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